terça-feira, dezembro 07, 2004

Interações subatômicas e as relações humanas (2)

(continuação)

Muito já foi escrito a respeito da questão filosófica que se coloca quando notamos que o homem é, como toda a matéria do universo, composto por partículas físicas elementares. Estas partículas, por sua vez, obedecem a leis físicas determinísticas em maior ou menor grau (aqui enquadramos todo comportamento caótico ou aleatório como determinismos em menor grau, à medida que é maior nosso desconhecimento dos mecanismos geradores de tais comportamentos).
Desde o advento, no século XX, das teorias da física quântica, essas questões aprofundaram-se, e ao mesmo tempo se esclareceram, pois a adição de uma incerteza inerente ao comportamento da matéria às leis da mecânica dita clássica, torna mais cômodo o enquadramento do homem como sistema físico.
Uma das observações cruciais da mecânica quântica, que sobremaneira incomodou Einstein, mas que é hoje fato consumado, é a chamada ação à distância.
Em linhas gerais, trata-se de um fenômeno segundo o qual partículas fisicamente separadas interagem sem que haja um meio de transmissão conhecido. Pode-se ir mais além, afirmando que não há meio de transmissão algum, que de fato nada se movimenta entre as partículas, uma vez que, sendo a transmissão simultânea, a existência de uma via física de transmissão viria transgredir o princípio básico da relatividade segundo o qual nada pode viajar mais rápido do que a luz.
Esse texto não terá a pretensão de aprofundar-se no tema, mas, a título de ilustração, delinearemos os fatos básicos que dão luz a tal comportamento.

Dentro do arcabouço teórico da teoria quântica, ocupa lugar de destaque um princípio formulado por Heisenberg, denominado o princípio da incerteza. Segundo esse princípio, não se pode conhecer ao mesmo tempo e com precisão total todas as características de uma dada partícula. Em síntese, quanto mais precisamente medimos uma dada quantidade, mais imprecisão teremos em outra.
Tentando derrubar essa hipótese, Einstein concebeu experimentos conceituais segundo os quais mantendo-se duas partículas inicialmente juntas como um sistema, seria possível separá-las fisicamente e, através da observação da massa de uma e da velocidade de outra, conhecer a massa e a velocidade de ambas.
Ao realizar-se de fato o experimento, porém, foi possível constatar que, quando observava-se uma das partículas, a outra, mesmo fisicamente separada da primeira, modificava-se de forma a manter a incerteza. Essa modificação convencionou-se chamar ação à distância – é possível conectar duas partículas de forma indissolúvel, de modo que ao alterar-se uma delas influenciamos imediatamente a outra.

Como, então, quereremos aqui relacionar essa incerteza, e esse entrelaçamento de partículas, com o comportamento humano?

Voltando à situação que acima descrevemos, vamos formular a seguinte hipótese: temos que os dois sujeitos que estudamos aqui, rejeitado e rejeitante, mantinham inicialmente forte vínculo, interagindo entre si, fisica e intensamente, com frequência. Em assim sendo, podemos afirmar com tranquilidade que em muitos momentos os dois sujeitos comportavam-se como um sistema físico único, as partículas formadoras de seus corpos em estreita interação. Ora, porque não então sugerir que, dessa interação, algumas características de tais partículas podem conectar-se, de forma a permitir que posteriormente introduza-se uma ação à distância? Senão, vejamos.

Temos a resposta, aparentemente desestimulada, do rejeitante, que volta ao comportamento ativo no momento exato em que o rejeitado se desinteressa e perde a esperança de que suas relações tornem ao caráter inicial.
Observamos que tal resposta, entretanto, deve depender de alguma forma de um estímulo, mas que esse estímulo não tem nenhuma via possível de transmissão.
Nada mais natural, por conseguinte, que observando em conjunto esse fato e a hipótese da interação entre as partículas dos corpos de rejeitante e rejeitado, possamos propor que trata-se de uma ação à distância.
Assim, quando o rejeitado modifica interiormente seu comportamento e seus sentimentos, algumas características de suas partículas modificam-se (é claro que admitimos aqui que os sentimentos humanos estão relacionados a características atômicas ou subatômicas. Julgamos que tal proposição é razoável, uma vez que enxergamos sempre o homem como sistema inerentemente físico, sem jamais apelar para algum esoterismo exótico incluindo “energias” ou “karmas”, ou qualquer extravagância semelhante em nossa estrutura). A partir dessa modificação, essas partículas, digamos, emocionais, devem ser justamente aquelas que mais intimamente cointegravam-se com as partículas do rejeitante, e portanto instaurando-se a ação à distância o rejeitante imediatamente responde à nova atitude do rejeitado.

Portanto, está postulada a idéia central que permeou nosso discurso. A partir de uma resposta observada, sem nenhum estímulo visível ou conhecido, delineamos uma linha argumentativa através da física moderna que pôde produzir uma hipótese sobre a causa do fenômeno psíquico em questão.

Cabem aqui, evidentemente, novas perguntas: terá essa ação à distância sempre as mesmas consequências? Isto é, induzirá sempre o retorno do rejeitante ao comportamento ativo? E mais, será ela inevitável, ou sua ocorrência depende de outros fatores, como por exemplo a intensidade da conexão inicial entre rejeitante e rejeitado?

O propósito desse trabalho era simplesmente assentar as bases para investigações posteriores, propondo um ambiente em que entrelaçam-se a física e a psicologia. Trata-se de um texto bruto, ainda com muitas lacunas a serem preenchidas e erros a serem corrigidos. Tem, em suma, o propósito de levantar mais perguntas, e não de fornecer quaisquer respostas definitivas.
Para o futuro, deveremos analisar mais intimamente a coerência do que propusemos aqui, bem como tentar enquadrar outros comportamentos observados dentro dessa linha de pensamento, e voltar nossa atenção para as questões levantadas no parágrafo anterior.

Acreditamos, por fim, que nada é mais caro ao homem do que o questionamento, a observação curiosa dos fenômenos e a indagação das relações fundamentais que regem o mundo. Esperamos sempre que nossa humilde atitude venha a incentivar que mais e mais pessoas, leigos ou letrados, se debrucem sobre as questões cruciais do comportamento humano.

John Fucking Nash, 6 e 7 de dezembro de 2004

segunda-feira, dezembro 06, 2004

Interações subatômicas e as relações humanas (1)

Como meios de interação, o homem tem disponíveis diferentes veículos. Dentre eles, o mais fundamental, antigo e cristalizado, é o das relações humanas diretas. Estas se dão através principalmente da comunicação verbal, mas complementada pela expressão corporal e, como procurar-se-á defender abaixo, por elementos não tão claramente conhecidos ou definíveis.
A estrutura psíquica humana tem sido ampla e profundamente estudada há muito, embora de maneira mais científica a partir de Freud e a psicanálise, no século 19. Dentro desse contexto, muitos estudiosos procuraram encontrar sistemas que ajudassem a compreensão das reações humanas. Esses sistemas, seja no caso individual e interior (caso da Psicologia), seja no caso coletivo (no caso da Sociologia), propõem relações causais, dentro do possível (tratando-se sempre de ciências não exatas), para explicar o comportamento de homens ou sociedades face a diferentes estímulos.
O que especula-se aqui é que é possível atuar na direção oposta: a partir da observação recorrente de padrões no comportamento do homem, pode-se inferir causas não observáveis, fatores e forças a priori incognoscíveis, mas que uma vez aceitas podem levar a um maior entendimento da natureza reativa do psíquico.

Vamos assim à evidência que sugere tal idéia.

Sejam duas pessoas que mantém entre si relação estreita, tal que cada uma delas procura de forma ativa interagir com a outra. Vamos admitir que tal relação é de intensidade razoável, e que essa procura pela interação se dá por causas emocionais e não sociais.
Introduzimos então o acidente, o primeiro estímulo: um dos sujeitos abandona o comportamento ativo, e passa a responder somente quando procurado pelo outro.
Ainda estamos aqui nos domínios da psicanálise usual. Por isso, podemos lançar mão de suas estruturas e sistemas para compreender melhor a atitude que a pessoa, digamos, rejeitada, tomará diante do novo estado de coisas. Em suma: ainda partimos daqui desde o estímulo na direção da resposta.
Assim, o rejeitado poderá, dependendo do grau da intensidade que conferia em seu mundo interior à essa relação, assim como do tipo de personalidade que tem, replicar o comportamento do rejeitante ou permanecer agindo ativamente, em qualquer dos casos sentindo-se ofendido, magoado, ou mesmo indiferente.
Avançando, digamos que o rejeitado decide-se a agir como o rejeitante, mas que experimente de si para si um sentimento de perda, e alimente mesmo uma certa esperança não expressa de que a estrutura de suas relações volte à originalidade. Entretanto, passa-se o tempo e não há evidências de que tal acontecerá. O rejeitante parece ter aderido de forma consistente ao novo padrão de atuação, e o rejeitado, com maior ou menor velocidade, aceita o novo estado de coisas.
E é aí que aparecerá o fato, observado de forma recorrente, que motivou a tese de que tratamos. Precisamente no momento em que o rejeitado aceita a nova natureza de relações com o rejeitante, e igualmente abandona a procura ativa, mas agora sem mais o sentimento de perda e já desesperançoso de voltar ao esquema inicial, o rejeitante volta à linha ativa de atuação, procurando novamente o rejeitado.
Finalmente então chegamos ao ponto onde procuraremos caminhar na direção não usual, a saber, da resposta até o estímulo.
A resposta aqui, da parte do rejeitante, é a nova mudança de atitude.
Parece seguro afirmar, por outro lado, que não há estímulo observável que possa ter motivado tal resposta, já que ao replicar o comportamento passivo do rejeitante, o rejeitado não teve mais meios de indicar sua mudança de aspirações, ou de estimular o rejeitante de qualquer forma. Assumimos além de tudo aqui que não há conhecidos em comum, que porventura pudessem atuar como transmissores de estímulo.
Mesmo assim, é evidente que há alguma relação causal no ocorrido. Enfatizamos aqui novamente que fatos de tal natureza foram por nós amiúde observados.
Como podemos, então, caminhar de forma a propor algum tipo de estímulo, de ação à distância, de interação indireta, que esclareça tais ocorrências?

(continua)